Participar de uma maratona não exige apenas preparo físico e resistência muscular, mas também impõe um grande desafio ao sistema imunológico.
O exercício físico intenso e prolongado pode influenciar temporariamente a imunidade, deixando o organismo mais vulnerável a infecções, especialmente nas vias respiratórias. Atletas submetidos a esforços de alta intensidade apresentam maior incidência de infecções do trato respiratório superior.
Embora estudos anteriores tenham sugerido que as manifestações nas vias aéreas superiores estejam, em geral, relacionadas a infecções, também foram demonstradas associações com eventos inflamatórios e alérgicos. Corroborando essa ideia, alterações nas concentrações de IL-6 e IL-10 — marcadores inflamatórios — tanto no soro quanto na mucosa nasal, foram encontradas em maratonistas que apresentaram sintomas.
É justamente nesse contexto que os probióticos vêm ganhando destaque como possíveis aliados da saúde de atletas.
Pensando nisso, um estudo brasileiro publicado na revista Nutrients investigou os efeitos do consumo diário de leite fermentado contendo o probiótico Lactobacillus casei Shirota (Lcs) sobre a imunidade de maratonistas.
O estudo
Durante 30 dias antes da Maratona Internacional de São Paulo, 42 atletas amadores do sexo masculino foram divididos aleatoriamente em dois grupos: um recebeu diariamente 80 mL de leite fermentado contendo 40 bilhões da cepa Lactobacillus casei Shirota, enquanto o outro recebeu uma bebida placebo sem microrganismos vivos, mas sensorialmente muito semelhante.
Amostras de sangue e saliva foram coletadas antes do início da suplementação, 30 dias depois (sendo antes da maratona) e logo após a corrida, com o intuito de analisar marcadores inflamatórios e imunológicos. A ideia era observar se esse consumo contínuo do leite fermentado seria capaz de modular as respostas inflamatórias provocadas pelo estresse físico extremo da maratona.
Resultados promissores
Os participantes que consumiram o leite fermentado probiótico apresentaram melhor controle da resposta inflamatória sistêmica após a maratona. Em geral, após atividades físicas muito intensas, os níveis de IgA (imunoglobulina A secretora) tendem a cair, facilitando infecções. No grupo que consumiu o leite fermentado probiótico, os níveis de IgA salivar se mantiveram mais estáveis.
Além disso, o grupo consumidor do leite fermentado probiótico apresentou aumento dos níveis nasais de IL-10 (uma citocina anti-inflamatória clássica); redução dos níveis nasais de citocinas pró-inflamatórias; e diminuição da infiltração de neutrófilos na mucosa nasal, demonstrando um efeito anti-inflamatório.
Dessa forma, enquanto no grupo placebo, as citocinas pró-inflamatórias se elevaram de forma mais descontrolada após a prova, no grupo que ingeriu leite fermentado os indicadores inflamatórios permaneceram mais estáveis, indicando uma resposta de recuperação mais eficiente do organismo.
A pesquisa reforça o conceito de que alimentos funcionais, como o leite fermentado com probióticos, podem ir além da nutrição básica e oferecer benefícios aos atletas, especialmente em condições de estresse físico elevado. Contudo, vale ressaltar que outras variáveis também influenciam na resposta inflamatória do organismo, como sono e alimentação.
A cepa Lactobacillus casei Shirota já é bastante estudada e reconhecida por sua ação no equilíbrio da microbiota intestinal. Este estudo acrescenta à literatura científica uma evidência aplicável da cepa, demonstrando o potencial do leite fermentado como produto de valor agregado e aliado da saúde, abrindo caminho para o desenvolvimento de novos produtos voltados a públicos específicos e/ou recomendações dietéticas associadas com nutrição esportiva.
Referências bibliográficas
Vaisberg, M.; Paixão, V.; Almeida, E.B.; Santos, J.M.B.; Foster, R.; Rossi, M.; Pithon-Curi, T.C.; Gorjão, R.; Momesso, C.M.; Andrade, M.S.; et al. Daily Intake of Fermented Milk Containing Lactobacillus casei Shirota (Lcs) Modulates Systemic and Upper Airways Immune/Inflammatory Responses in Marathon Runners. Nutrients 2019, 11, 1678. https://doi.org/10.3390/nu11071678