O Schistosomus Reflexus (SR) é uma malformação congênita rara que acomete, principalmente, ruminantes, sendo mais prevalente em bovinos. Essa condição caracteriza-se por deformidades anatômicas severas, como fissura ventral, curvatura acentuada da coluna vertebral e evisceração ou inversão dos órgãos internos. Embora também ocorra em outras espécies, a predominância em bovinos torna essa anomalia um tema relevante para a medicina veterinária, sobretudo no manejo obstétrico e reprodutivo (Ezakial et al., 2018; Cala et al., 2019).
Etiologia e desenvolvimento
A etiologia do SR ainda não é totalmente compreendida, mas há fortes indícios de que fatores genéticos tenham um papel significativo na predisposição à condição. Alterações no desenvolvimento embrionário, especialmente nas fases iniciais da gestação, são consideradas as principais responsáveis pelas deformidades características. Estudos sugerem que mutações genéticas interferem no fechamento adequado da parede corporal ventral e no alinhamento correto da coluna vertebral, embora os mecanismos exatos ainda sejam objeto de investigação (Azawi et al., 2012; Patel et al., 2015; Bertolo et al., 2017).
Manifestações clínicas
As manifestações clínicas do SR em bovinos incluem anomalias anatômicas severas, como:
- Fissura ventral completa;
- Evisceração de órgãos internos;
- Curvatura pronunciada da coluna vertebral, formando padrões em "U" ou "S";
- Membros rotacionados e órgãos localizados em posições anômalas.
Essas características geralmente são detectadas durante o parto, já que fetos com SR causam intensa distocia. O diagnóstico precoce e a intervenção obstétrica são cruciais, pois a obstrução causada pela deformidade impede o parto vaginal (Laughton et al., 2005; Prestes e Megid, 2010; Bertolo et al., 2017).
Manejo e impacto econômico
O SR é incompatível com a vida extrauterina, portanto, o manejo veterinário prioriza a saúde e o bem-estar da vaca. A cesariana é a intervenção mais indicada em casos de distocia severa, visando preservar a integridade uterina e minimizar complicações. Estudos ressaltam a importância de intervenções rápidas para prevenir problemas pós-parto, como infecções e traumas uterinos (Ferreira et al., 2013).
Embora a prevalência do SR seja baixa, ele representa um desafio econômico devido aos custos associados ao manejo veterinário e ao risco de mortalidade das vacas. Além disso, há evidências de que fatores como consanguinidade e o uso de determinadas linhagens genéticas podem aumentar a incidência da condição (Agerholm et al., 2001; Dubiella et al., 2016).
Estudo de caso: novilha leiteira em Coimbra-MG
Para exemplificar o caso citado acima, uma novilha leiteira da raça Holandesa foi atendida em uma propriedade rural em Coimbra-MG apresentando um quadro de distocia. Durante o trabalho de parto, observou-se dilatação cervical adequada e ruptura das bolsas alantoide e amniótica. A avaliação clínica indicou sinais vitais normais, e o animal estava em estação. Contudo, no exame obstétrico, identificou-se uma anormalidade na conformação fetal, inviabilizando a tração (Imagem 1).
Imagem 1. Novilha holandesa em trabalho de parto expondo órgãos do feto.
Fonte: Arquivo pessoal, 2024.
Diante da condição, optou-se pela realização de uma cesariana, já que o parto vaginal era inviável devido ao tamanho e à posição do feto. O diagnóstico de Schistosomus Reflexus foi confirmado pelos achados clínicos e morfológicos durante o procedimento.
O feto apresentava deformidades severas, incluindo:
- Dorsoflexão da coluna vertebral, resultando em curvatura ventral aguda;
- Falha no fechamento da parede abdominal, expondo órgãos internos como fígado, câmaras digestórias e intestinos. (Imagens 2 e 3).
Imagens 2 e 3. Bezerra apresentando características de SR, com exposição de vísceras abdominais devido ausência da parede ventral do abdome e dorsoflexão da coluna vertebral.
Fonte: Arquivo pessoal, 2024.
No pós-operatório, a vaca recebeu terapia com antibióticos, anti-inflamatórios e analgésicos para controle da dor e prevenção de infecções. A recuperação foi satisfatória, com melhora progressiva nos dias seguintes ao procedimento.
Casos como o de Schistosomus Reflexus ressaltam a importância do diagnóstico precoce e da intervenção obstétrica para assegurar a saúde das vacas. Além disso, é necessário intensificar pesquisas sobre os fatores genéticos e ambientais que contribuem para a ocorrência dessa anomalia, a fim de minimizar impactos econômicos e reprodutivos no setor agropecuário.
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Autores
Isabella Carneiro Motta - Universidade Édson Antônio Velano - UNIFENAS;
Gabrielle Nunes Peregrino - Centro Universitário de Viçosa - UNIVIÇOSA;
Gustavo Samuel Alves Rodrigues - Universidade Federal de Viçosa - UFV;
Itamar Henrique Lemes de Aguiar - Universidade Federal de Viçosa - UFV;
Octhavio Henrique Amaral - Médico Veterinário do Programa de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira – PDPL.