O estado de Minas Gerais tem constantemente trabalhado para o reconhecimento e legalização dos Queijos Minas Artesanais, reconhecendo os diversos tipos de queijos artesanais produzidos no estado, identificando as regiões produtoras, estabelecendo regulamentos técnicos de identidade e qualidade. O ano de 2024 representou um marco para os produtores de Queijos Minas Artesanais, consolidando avanços que reforçam a importância econômica e cultural dos queijos.
Um dos principais destaques foi o aprimoramento das legislações relacionadas à produção e comercialização desses queijos, trazendo maior segurança tanto para os produtores quanto para os consumidores. A Portaria nº 2.303 do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), a Portaria nº 2.307 (IMA) e a Lei nº 24.993 (MINAS GERAIS) foram celebradas como grandes avanços no fortalecimento da produção de Queijos Minas Artesanais em 2024. Além das legislações, os Modos de Fazer o Queijo Minas Artesanal foram reconhecidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, reafirmando a relevância cultural e histórica dessa tradição para o Brasil e para o mundo. Esses marcos regulatórios e reconhecimentos são frutos de anos de dedicação dos produtores, associações, aliados aos esforços de pesquisadores e do governo que buscam garantir a autenticidade, a segurança alimentar e o reconhecimento cultural desses produtos.
As novas normas não apenas valorizam as práticas tradicionais, transmitidas entre gerações, mas também reconhecem e destacam a importância de uma variedade de queijo até então emblemática: o Queijo Minas Artesanal de Casca Florida Natural. Em 2022, a Resolução 42 da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais (SEAPA) reconheceu a variedade “Casca Florida” dos queijos minas artesanais produzidos no estado. O queijo Minas Artesanal de Casca Florida Natural é reconhecido por suas características distintas que o tornam um produto único. Destacado pela casca branca, devido ao desenvolvimento do fungo Geotrichum candidum na superfície, esse queijo apresenta massa firme, superfície enrugada, aroma e sabor marcante (Figura 1). Este queijo artesanal é valorizado, não apenas em Minas Gerais e no território nacional, mas também em mercados internacionais, sendo considerado um produto de alta qualidade e atributos sensoriais únicos. Recentemente, a produção ganhou importância e reconhecimento com diversos produtores premiados em importantes competições internacionais, como Mondial du Fromage de Tours, na França.
Figura 1. Queijo minas da casca florida natural da região do Cerrado
Fonte: Os autores, 2023.
O Queijo Minas Artesanal de Casca Florida Natural é produzido de maneira tradicional, com o uso de leite cru fresco, isto é, a matéria-prima não a por processo de pasteurização. Além disso, utiliza-se o “pingo”, que é um fermento lático natural obtido a partir da fabricação de queijo do dia anterior. O uso de leite cru e pingo preserva as características naturais e a microbiota nativa, denominada também de microbiota terroir de cada região, conferindo a cada queijo características sensoriais próprias e distinguindo-o dos produtos industrializados.
No dia 14 de junho de 2024, o Governo do Estado de Minas Gerais, por meio do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), publicou a Portaria n° 2.307 onde se encontra as normas de identidade e qualidade para a produção do Queijo Minas Artesanal de Casca Florida Natural. Essa portaria estabelece critérios que devem ser seguidos pelos produtores, incluindo denominação de venda, padrões de higiene, composição, processos de fabricação, características físicas e sensoriais do queijo e critérios microbiológicos. A publicação desse regulamento é de extrema importância, pois reconhece oficialmente a importância cultural, social e econômica desse produto.
Os estudos que levaram à publicação do regulamento foram extensos e envolveram diversas instituições de ensino superior parceiras da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais (Seapa). As pesquisas envolvendo essa variedade de queijo deram início no ano de 2017 na Universidade Federal de Lavras (UFLA) pelo Departamento de Ciência dos Alimentos, onde foi identificado a predominância do fungo Geotrichum candidum no queijo durante a etapa de maturação. Os resultados obtidos em instituições de pesquisa, especialmente na UFLA, tiveram impacto direto na implementação de medidas que viabilizaram a regulamentação do produto. Foram realizadas pesquisas sobre as práticas tradicionais de produção, as condições climáticas e geográficas das regiões produtoras, alterações durante a etapa de maturação e os aspectos microbiológicos do queijo. Os resultados desses estudos foram fundamentais para a elaboração de normas que garantiam a qualidade e a segurança do produto sem comprometer suas características tradicionais.
A publicação do regulamento representa uma vitória significativa para os produtores de queijo artesanal de Minas Gerais. Com as novas normas, os produtores têm a garantia de que seu produto será reconhecido e valorizado no mercado, o que pode abrir novas oportunidades de comercialização, tanto no Brasil quanto no exterior. Além disso, o regulamento ajuda a proteger o produto contra imitações e fraudes, assegurando que os consumidores recebam um queijo autêntico, seguro e de alta qualidade.
Os produtores de Queijo Minas Artesanal de Casca Florida Natural têm agora um respaldo legal para sua atividade, o que pode incentivar novos investimentos e melhorias nas técnicas de produção. A regulamentação também contribui para o desenvolvimento sustentável das comunidades rurais e famílias que sobrevivem do agronegócio e estão envolvidas na produção de queijo, promovendo a geração de renda e a preservação do patrimônio cultural mineiro. Para os produtores, essa conquista é o reconhecimento de anos de trabalho árduo e dedicação à “arte de fazer queijo”.
Para fechar o no de 2024 com chave de ouro, no dia 04 de dezembro de 2024 a UNESCO reconheceu os Modos de Fazer o Queijo Minas Artesanal como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. Esse ato destaca a importância cultural, histórica e social dos saberes e práticas envolvidas na produção do queijo artesanal em Minas Gerais. O título da UNESCO reforça o compromisso com a preservação desse patrimônio e valoriza o papel dos produtores na manutenção dessa tradição única, reconhecida agora como um legado de Minas Gerais para o mundo.
Finalmente, a valorização do Queijo Minas Artesanal de Casca Florida é um exemplo de como a união entre tradição familiar, pesquisa e extensão pode resultar em benefícios significativos para a sociedade. A preservação das técnicas tradicionais familiares, aliada aos critérios de qualidade e amparados por metodologias científicas, garante um produto autêntico e seguro para os consumidores. Essa iniciativa do Governo de Minas Gerais serve como modelo para outras regiões do país que também buscam proteger e valorizar seus produtos tradicionais e regionais.
Autores
Miriam Aparecida de Aguilar Santos, Engenheira de Alimentos, Mestre em Ciência dos Alimentos e doutoranda do Laboratório de Micotoxinas e Micologia de Alimentos.
Kelly Aparecida da Cunha Pereira, Nutricionista, Mestre em Ciência da Nutrição e doutoranda do Laboratório de Micotoxinas e Micologia de Alimentos
Prof. Dr. Luís Roberto Batista, Professor do Departamento de Ciência dos Alimentos da UFLA e coordenador do Laboratório de Micotoxinas e Micologia de Alimentos.
Profa. Dra. Jaqueline de Paula Rezende, Professora do Departamento de Ciência dos Alimentos da UFLA.
Profa. Dra. Ana Clarissa dos Santos Pires, Professora do Departamento de Tecnologia de Alimentos da UFV e coordenadora do Laboratório de Termodinâmica Molecular Aplicada (THERMA-UFV)
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Referências bibliográficas
ASSOCIAÇÃO MINEIRA DE MUNICÍPIOS. Queijo Minas Artesanal foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. Disponível em: https://portalamm.com/queijo-mnas-artesanal-foi-reconhecido-como-patrimonio-cultural-imaterial-da-humanidade/. o em: 10 dez. 2024.
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FREQUÊNCIA UFLA: conheça a história da descoberta do fungo Geotrichum candidum no Queijo Minas Artesanal de Casca Florida Natural. UFLA. Disponível em: https://ufla.br/noticias/extensao/16835-frequencia-ufla-conheca-a-historia-da-descoberta-do-fungo-geotrichum-candidum-no-queijo-minas-artesanal-de-casca-florida-natural. o em: 11 out. 2024.
Governo de Minas regulamenta queijo de casca florida natural. Governo do Estado de Minas Gerais. Disponível em: https://www.mg.gov.br/agricultura/noticias/governo-de-minas-regulamenta-queijo-de-casca-florida-natural. o em: 11 out. 2024.
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MINAS GERAIS. Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Lei nº 24.993, de 25 de setembro de 2024. Institui a Política Estadual Queijo Minas Legal – PEQML. Minas Gerais, Belo Horizonte, 25 set. 2014.
MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Resolução nº 42, de 27 de dezembro de 2022. Reconhece o Queijo Minas Artesanal na variedade Casca Florida produzidos nos municípios do Estado de Minas Gerais. Diário do Executivo, Belo Horizonte, ano 130, n. 261, p. 7, 28 dez. 2022.
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Queijo mineiro com fungo e leite cru: como manter a tradição sem abrir mão da segurança alimentar. Agência Minas. Disponível em: https://www.agenciaminas.mg.gov.br/noticia/queijo-mineiro-com-fungo-e-leite-cru-como-manter-a-tradicao-sem-abrir-mao-da-seguranca-alimentar. o em: 16 de out. de 2024.